REPORTAGEM ETNOGRÁFICA EM 25 DE MARÇO DE 2019
Projeto voluntário em Campina Grande resgata pessoas das ruas que sofrem com dependência química
Por Elisângela Andrade e Iara Lima
Ação do Noite Adentro. 25 de março de 2019
Já se imaginou caminhar pelas ruas à meia noite no frio e com estômago embrulhado de fome? Em Campina Grande, crianças, mulheres, homens e idosos passam por essa realidade e fazem atividades diversas para conseguir comer algo no fim do dia: limpam para-brisas de carros, pedem dinheiro no sinal, se prostituem. Sujeitos à tudo na rua, muitos encontram nas drogas um refúgio. Com a finalidade de ajudar essas pessoas, Ravardieri Brandão criou e coordena o projeto “Noites Adentro”. Brandão, natural de João Pessoa, trabalha com projetos sociais há mais de 15 anos em diversos locais por onde morou. Viveu com um irmão dependente de drogas ainda na adolescência, vivenciou situações de crises em casa e até chegou a usar, mas seguiu outro caminho. Atleta profissional de judoca e MMA, residiu em muitos estados brasileiros e teve contato com várias realidades sociais e sentiu a necessidade de ajudar. Em 21 de maio de 2015 iniciou seu projeto com pessoas em situações de rua e dependentes químicos. “Com as ações nas ruas, auxiliando social e espiritualmente, vimos a necessidade de não fazer só isso, mas também de tirá-los das ruas e dar uma oportunidade de mudança de vida”, contou ele.
O ex-atleta conta com voluntários e patrocinadores. Muitos deles são evangélicos, mas Brandão explica que o objetivo não é só evangelizar. “Eu rodei muito, andei em muitos cantos e conheço bem esse mundão deles. Isso facilita a aproximação. É difícil chegar lá e dizer que foi falar de Deus, eles não te recebem como alguém que não sabe do que está falando, ‘esse cara fala de Deus mas não sabe o que eu passo". O coordenador acredita que sua experiência com drogas o torna mais próximo daquelas pessoas.
Por isso, as ações se fazem com voluntários que, juntos à Brandão e após ouvir suas instruções, levam comida, café, chá, um abraço, uma palavra de apoio, uma música tocada ao violão. Há quem se interessa só pelo alimento e um abraço, mas outros já estão decididos e aceitam o desafio de ir para a ONG para abandonarem as ruas e o vício.
Do Projeto à ONG - E com luta, voluntariado e amor se constrói uma casa
Logo, as ações na madrugada, levando comida, uma palavra de apoio, de fé, não foram suficientes para Brandão que não queria apenas ajudar mas provocar mudança de vida para aqueles que aceitassem.Para isso era necessário um local e uma casa foi alugada para abrigar pessoas. Aos poucos se conseguiu mobília simples como cama, ventilador, colchões e comida. Hoje, localizada no Catolé, uma grande casa se faz lar para 15 homens resgatados das ruas e que disseram seu “sim” para si, para um recomeço, para uma nova vida. Por enquanto, não há espaço e possibilidade de atender mulheres, mas é objetivo expandir a ação para elas quando houver recursos, local específico e voluntárias do sexo feminino. A ONG é formada por homens voluntários. É preciso uma grande força de vontade para quem deseja se tornar um novo ser na sociedade. Quem veste a camisa do projeto, se doa e acredita no poder da mudança, chama Brandão de pai, por além de oferecer afeto, também ensinar. Depois que estes homens saem da ONG, renovados, eles continuam a visitar os momentos do projeto nas madrugadas com objetivo de levar esperança para quem passa o que eles já viveram.
Conhecido na cidade, o Noite Adentro conta, por vezes, como o apoio de emissoras de comunicação, que através de matérias especiais conseguem divulgar o belo trabalho, angariar doações e chamar atenção de novos voluntários.
João Alisson, há 2 meses na ONG
João Alisson, de 17 anos é um dos integrantes da casa de assistência. Ele já havia passado pelo “Lar do Garoto” dos 14 aos 16 anos e após sair desse instituto, se envolveu em uma briga e acabou levando duas facadas nas costas que atingiu seus pulmões. Assim que se recuperou, procurou Ravardieri, líder da ONG, em busca de socorro: “Quando saí do hospital eu fui para casa e liguei para Brandão para ele me ajudar, me dar uma força e ele me trouxe para cá. Há dois meses eu estou aqui”.
Conseguir abandonar o vício não é um processo rápido nem fácil, mas com força de vontade e apoio é possível. “Tô gostando demais, é muito bom estar aqui para mudar. Tem gente que vem passar só uns dias, eu estou para mudar a minha vida, esse ano que eu vou passar aqui é um ano de batalhas, mas sei que vou conseguir” .
João Paulo, um dos 6 homens salvos
João Paulo, 19 anos, entrou na ONG em 30 de janeiro de 2018 e saiu exatamente no dia 30 de janeiro de 2019. Dependente químico desde os 13 anos, João começou a usar drogas por influência dos amigos, dentre elas, a cocaína. “Em 2017 o Espírito Santo já vinha tratando coisas comigo e eu já estava acreditando que o meu 2018 ia ser bem diferente”. João disse que Deus o tirou de um lamaçal e quando tudo parecia não ter saída, ele encontrou na fé, a força que precisava para conseguir abandonar o vício com o apoio dos que fazem o projeto.
Hoje, João é um dos 6 homens recuperados, incluso na sociedade através desse trabalho feito na instituição. Está morando com a mãe e fazendo o RHEMA (Instituição de Ensino Bíblico). “Hoje eu tenho um chamado de Deus” .
FOTO: VIVÊNCIA PARA A REPORTAGEM ETNOGRÁFICA EM 25 DE MARÇO DE 2019
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